A LUA E O QUEIJO : O FOGÃO A LENHA E A FERROVIA

domingo, 16 de fevereiro de 2020

O FOGÃO A LENHA E A FERROVIA




Desde que nasci, meus irmãos também, claro, a gente está envolvido com a ferrovia e os trens.
Todas as casas de nossa Vila Operária tem um fogão a lenha. A nossa também. Mas aqui nós não usamos lenha no fogão. O nosso fogão a lenha funciona com serragem. Serragem eh o pó que sai da madeira quando ela eh serrada. E meu pai sempre diz que serragem e lenha no fogão, não faz diferença, funciona do mesmo jeito.


Moramos na Vila Operária que fica no terreno da ferrovia onde estão as oficinas e todos os departamentos da ferrovia, inclusive a marcenaria. Esta marcenaria fabrica móveis e também a madeira que eh colocada em muitos vagões. Eles trabalham o dia inteiro nesta marcenaria e, todos os dias da semana. Com este trabalho a marcenaria da ferrovia produz muita serragem, que para eles eh só um resíduo descartável, para nós era combustível.


Toda sexta feira a ferrovia permitia que qualquer família da Vila pegasse serragem para o fogão, ou para colocar no piso do galinheiro. A maioria das casas de nossa vila tinha galinheiro. Aqui em casa também. A gente colocava serragem todos os sábados e retirava na sexta feira seguinte. Isto todas as semanas e o ano inteiro. Tudo que a gente tinha que fazer era buscar serragem na marcenaria da ferrovia. E isso eu e dois irmãos meus fazíamos todas as sextas feiras.
Cada um de nós pegava um saco de linhagem. Saco de linhagem era um saco grande feito de linha amarronzada. Geralmente colocavam nele milho ou feijão. Ele cabia sessenta quilos de milho ou feijão. Meu pai conseguia estes sacos de linhagem na cooperativa da Ferrovia. A cooperativa vendia milho e feijão a granel, isto eh, a quantidade que você quisesse. Assim quando acabava todo o milho ou feijão que estava no saco, a cooperativa guardava estes sacos de linhagem para dar aos funcionários que buscavam serragem na marcenaria.


A gente só podia buscar a serragem depois que terminava o expediente na ferrovia, que era as quatro e meia da tarde. Quando a gente chegava lá, meu pai já estava esperando para encher os sacos com a serragem. Assim vinha meu pai trazendo dois sacos com serragem, porque não ficavam pesados, e só ele conseguia levar dois de uma vez, enquanto eu e meus irmãos vinha com um saco cada um. Eu geralmente vinha arrastando o saco com a serragem, porque ele era quase do meu tamanho e então eu não conseguia colocar ele nos ombros como meu pai e irmãos faziam. Mas era bem perto de casa, então não era tão difícil assim.


Na nossa casa tinha uma coberta ao lado do fogão a lenha que era onde a gente deixava os sacos com a serragem para serem usadas no nosso fogão a lenha. No dia seguinte a gente tirava a serragem do galinheiro, colocava no nosso carrinho de madeira, que meu pai tinha feito, e jogava a serragem velha em um lugar na Vila Operária chamado de Buracão. Era onde todos da vila jogavam serragem usada nos galinheiros e outros lixos. Da beirada deste Buracão a gente via o Rio Itapecerica passando lá em baixo. Deveria ter uns vinte metros de altura. As cinzas do nosso fogão também eram jogas neste Buracão. 
Sábado era dia de trocar a serragem do galinheiro, mas todos os dias a gente tinha que Socar o Fogão. E claro, ninguém gostava de Socar o Fogão. Mas eu conto o que eh isso na próxima viagem.





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